sábado, 30 de janeiro de 2010

O Haiti e a cegueira

Certos fatos que nos chegam ao conhecimento todos os dias comprovam a análise do comportamento humano evidenciado por Saramago em "Ensaio sobre a cegueira".
Em meio a toda essa tragédia no Haiti, não bastasse a condição miserável vivida por aquele país já antes do terremoto (e agora, ainda mais), chega a notícia de que a polícia haitiana já registrou vários casos de estupro a mulheres e crianças, ocorridos após, e em função do terremoto. Segundo afirmou o diretor da polícia local à agência internacional de notícias AFP, criminosos aproveitaram o corte de energia para atacar mulheres e meninas refugiadas nas barracas.
A leitura dessa notícia remeteu-me instantaneamente ao texto de Saramago, talvez até pelo fato de, coincidentemente, ter sido exatamente a falta de luz, a escuridão plena, a cegueira total, o mote para que esses criminosos praticassem os estupros. Incapazes de dimensionar a intensidade do sofrimento que acometia suas vítimas naquele momento (a maioria perdeu parentes e a própria casa), esses marginais enxergaram na fragilidade daquelas pessoas tão-somente uma oportunidade para satisfazer seus mais primitivos instintos sexuais, como se fossem homens-de-neandertal, como se vivessem trezentos mil anos atrasados no tempo.

Penso que esse tipo de comportamento, embora alguns possam dizer que seja próprio do ser humano, que esteja arraigado em sua natureza, pode, sim, ser transformado, principalmente se considerarmos a oportunidade que temos hoje de viver num mundo globalizado, em que pessoas dos cinco continentes se falam, se conhecem, trocam experiências.

É tempo de mudanças... É tempo de sermos verdadeiramente irmãos, de levar a todos, brasileiros e estrangeiros, as lições de amor, caridade e fraternidade, esses sim, sentimentos universais, inerentes ao ser humano, e que devem ser potencializados, exercitados dia a dia.


É preciso matar de vez esse ímpeto vil e irracional que ainda mantém nossa condição de simples animais, e nos afasta do desenvolvimento maior, enquanto seres divinos.


Grande abraço.


Douglas Drumond

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Saramago e a cegueira

Acabo de ler dois livros de Saramago: "Caim" e "Ensaio sobre a cegueira". Há tempos tinha vontade de ler Saramago, mas sempre acabava adiando; agora li. Adorei. Principalmente "Ensaio...", uma análise profunda sobre o comportamento humano, sua natural condição de lobo do próprio homem, como pensava Thomas Hobbes (homo homini lupus), que, não obstante a cegueira geral, o sofrimento coletivo, é capaz de manter, e até potencializar, as relações de poder e domínio sobre seus semelhantes. Interessante a metáfora usada pelo autor, ao eleger a cegueira como elemento de limitação e de sofrimento: a cegueira do homem moderno, egocêntrico e individualista; a cegueira do autoritarismo, a cegueira da falta de ética, enfim, a cegueira para o que realmente importa...

A trama se dá à medida em que as pessoas de uma cidade vão ficando cegas, uma a uma, subitamente, numa epidemia de uma cegueira contagiosa, que leva as autoridades a isolar os primeiros grupos de cegos em um antigo manicômio, na tentativa vã e atrapalhada de extirpar o problema.

Cria-se, então, nesse isolamento, um mundo à parte, em que os confinados, cegos, sem comida suficiente, sem pessoas sãs a ajudar - ninguém que ainda não fosse cego se dispunha a arriscar-se a ser também contagiado pela doença -, sem as providêncais mais básicas de higiene, têm de... sobreviver. Nesse mister, criam-se grupos distintos; um deles tenta dominar pela força, e inicialmente consegue...

Em determinado momento, todos na cidade cegam, inclusive os guardas que mantinham o manicômio fechado. Sem guardas a vigiá-los, os cegos do manicômio saem, e inicia-se uma nova luta pela sobrevivência, agora não mais no microcosmo do manicômio, mas a céu aberto, na cidade inteira, visão do inferno: imunda, mal-cheirosa, sem luz, sem água, com cadáveres em decomposição por toda parte, alguns devorados pelos cães famintos...

Vale a pena ler "Ensaio sobre a cegueira". É um livro profundo, empolgante, que nos faz refletir sobre nossa própria condição, sobre nosso próprio comportamento enquanto parte de uma engrenagem a que chamamos humanidade.



Grande abraço.


Douglas Drumond

O blog, por ele mesmo

Esta primeira postagem tem o caráter, digamos, metalinguístico de explicar a própria existência do blog: imaginei usar este espaço para, pura e simplesmente, me expressar; dizer o que penso de quase tudo, mas principalmente criar o hábito de escrever. Óbvio, não tenho aqui a menor pretensão de influenciar quem quer que seja - nem me imagino com tal poder - mas acho interessante a experiência de expor minhas opiniões, argumentar, como um colunista de jornal, fazer de conta ser alguém que cotidianamente se dirigisse às pessoas. Talvez divulgue este blog... talvez aos amigos... talvez nem a eles... talvez...


Douglas Drumond